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Todos sabem que muitos problemas de saúde são complexos, duradouros e dispendiosos, exigindo internações e acompanhamentos frequentes bem como medicina de alta tecnologia.

Dentre esses se encontram doenças detectadas na infância como Síndrome de Down e autismo e outras que acometem os mais idosos como Mal de Alzheimer e Parkinson. Uma dúvida frequente é se os planos e seguros de saúde cobrem as despesas e tratamentos decorrentes desses males.

A lei que dispõe sobre planos e seguros de saúde (Lei 9.656, de 1998) determina cobertura obrigatória para as doenças listadas na relação de enfermidades catalogadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e chamada Classificação Estatística Internacional de Doenças e de Problemas Relacionados à Saúde (CID 10). As enfermidades acima constam da CID 10 bem como outras de complexidade similar.

Pode haver carência de uso do plano no tratamento dessas doenças. Nos planos individuais, tais enfermidades são geralmente classificadas como preexistentes e, como tal, sujeitas à carência de 24 meses. Já no caso de planos corporativos com mais de 30 beneficiários, as carências não existem e mesmo os filhos maiores de 21 anos, sem condições de manutenção, tem o mesmo direito de acesso ao plano.

Uma vez superado o problema da carência, para ter cobertura, o tratamento deve constar de Resolução Normativa (RN) da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A RN em vigor atualmente é a de número 338, de 2013. No Anexo II, intitulado “Diretrizes de Utilização para Cobertura de Procedimentos em Saúde Suplementar”, consta a quantidade mínima obrigatória de consultas/sessões por ano que os planos devem bancar em diversos tratamentos como os requeridos em enfermidades de longo prazo.

Por exemplo, no caso de fonoaudiólogos, a RN 338 fixa um mínimo de 24 consultas/sessões por ano para pacientes com gagueira, fenda palatal e outras enfermidades e 48 consultas/sessões por ano para pacientes com transtornos globais do desenvolvimento (dentre os quais o autismo), entre outros. No caso de psicólogo e/ou terapeuta ocupacional, há um mínimo obrigatório de 40 consultas/sessões por ano para pacientes com esquizofrenia e transtornos globais do desenvolvimento (autismo). No caso de terapeuta ocupacional, exclusivamente, a RN fixa um mínimo de 12 consultas/sessões por ano para pacientes com diagnóstico de demência e pacientes com transtornos específicos do desenvolvimento. E assim por diante.

Todos os planos garantem este mínimo obrigatório de consultas/sessões fixado pela ANS. Ocorre que, em certos casos, isto é considerado insuficiente pelos médicos responsáveis, a operadora recusa cobertura e a Justiça é acionada. Quando isto acontece, tudo depende do entendimento do Judiciário de ser ou não abusiva tal negativa.

Um argumento é de que o rol de procedimentos da ANS não pode se sobrepor à Lei 9.656/98 nem ao Código de Defesa do Consumidor. O contra-argumento é de que a Lei 9.656/98, precisamente, dá competência à ANS para definir “a amplitude das coberturas, inclusive de transplantes e de procedimentos de alta complexidade” (art. 10 § 4º).

Os transtornos mentais e comportamentais também constam da CID 10. O capítulo V trata da doença de Alzheimer e de Parkinson; dos transtornos de esquizofrenia; dos transtornos de humor; dos distúrbios neuróticos e da personalidade, dentre muitos outros. A Lei 9.656/98 bem como a RN 338 determinam que, nos planos hospitalares, as internações, inclusive em centros de terapia intensiva, não podem sofrer limitação temporal nem se sujeitam a cláusula de coparticipação.

Há casos, como de doenças terminais, em que a internação pode ser substituída por tratamento domiciliar. A Lei 9.656 estabelece que, se a operadora oferecer a internação domiciliar em substituição à internação hospitalar, ela deverá cobrir as despesas referentes a honorários médicos e serviços gerais de enfermagem; exames complementares indispensáveis para o controle da doença; acompanhante no caso de pacientes menores de dezoito anos e tratamentos antineoplásicos ambulatoriais e domiciliares. Nos casos em que a assistência domiciliar não se dá em substituição à internação hospitalar, a cobertura deverá obedecer à previsão contratual ou à negociação entre as partes.

Certas deficiências, principalmente, transtornos psicológicos raros, não estão catalogadas na CID 10 e podem ter tratamento negado. Entretanto, quando acionado, é comum o Judiciário entender que, se tais deficiências estão intimamente relacionadas a distúrbios físicos e mentais e estes exigem tratamento, as operadoras devem dar cobertura.

Impelida pela ação do legislador, a judicialização da saúde tem sido crescente no Brasil. No caso do autismo, por exemplo, a Lei 12.764, de 2012, instituiu Política Nacional que prevê em seus artigos 2°, III e 3°, III, “b” a obrigatoriedade do fornecimento de atendimento multiprofissional ao paciente assim diagnosticado. Recentemente, em outro exemplo, o Senado aprovou projeto que proíbe definitivamente as Operadoras de saúde de classificarem doenças congênitas como preexistentes.

Em suma, a legislação atual garante cobertura ao tratamento de diversas doenças de longo prazo, quer via sessões multidisciplinares (psicólogos, fonoaudiólogos etc) ou via internações.

É de se perguntar inclusive se tão intensa atividade legal não pode, ao fim e ao cabo, prejudicar o conjunto dos consumidores hipossuficientes de planos ou seguros de saúde.

De fato, o seguro se baseia no princípio do mutualismo em que muitos contribuem com pouco para que poucos recebam muito. Já a economia não pode escapar da lei da escassez: neste mundo, salvo milagre, não existe almoço grátis. Isto posto, o exagero de proteção a qualquer das partes num plano ou seguro de saúde (na verdade, em qualquer seguro) leva fatalmente a maior exação sobre os demais assistidos, resultando no encarecimento do contrato, na redução de coberturas ou na transferência da conta excedente para outrem. Em todos os casos, as consequências são danosas para o grupo maior que se pretendeu proteger.

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