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Genebra Seguros
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Este artigo objetiva tratar da interversão da posse. A abordagem tem início com o conceito de posse, em seguida são apresentados os diferentes critérios de classificação da posse. Finalmente, analisa-se o fenômeno da interversão da posse.
Conceito de Posse
Segundo Álvaro Villaça Azevedo (2019) para estabelecer o conceito de posse surgiram diversas teorias e as mais importantes são a de Ihering e a de Savigny. A teoria de Savigny baseia-se no Direito Romano da época clássica, que confere maior evidência à intenção do possuidor, conhecida como subjetiva ou teoria da vontade. Para Savigny dois elementos integram o conceito de posse: o corpus e o animus.
Conforme indicado pelo autor, para a teoria de Ihering conhecida como objetiva o corpus e o animus estão reunidos, assim, basta a existência de corpus. Para Ihering onde é possível a propriedade é possível a posse. Tanto o Código de 1916 quanto o Código Civil de 2002 adotam a teoria objetiva.
Pode-se dizer que a teoria subjetiva é alvo de críticas pela teoria objetiva, que subordina a posse à propriedade. A concepção objetiva, por sua vez, é muito criticada, tendo em vista que reduz a posse a um direito ínfimo, diminuindo a sua importância social.
Destaca-se que ambas as teorias trouxeram muitas contribuições sobre a temática. Contudo, muito se argumenta de que a discussão envolvendo a posse precisa avançar para além dessas teorias, já que no Brasil, frequentemente, está-se diante de situações envolvendo o conflito entre posse e direito de propriedade. Diversos operadores do Direito sinalizam a necessidade de se conferir maior importância à posse e à função social da posse, temática que se relaciona com o direito à moradia.
Classificação da Posse
No que se refere à classificação da posse, cabe informar que comporta diversas modalidades, com relação à pessoa-coisa / desdobramento, à presença de vícios, à boa-fé, à presença de títulos, ao tempo – nova ou velha – e aos efeitos – posse ad interdicta e posse ad usucapionem.
Para Flávio Tartuce (2020, p. 43) a posse quanto à pessoa-coisa pode ser direta ou imediata, indireta ou mediata. A primeira “é exercida por quem tem a coisa materialmente”, por exemplo, a posse exercida pelo locatário. A segunda é exercida por intermédio de outra pessoa, ocorrendo mero exercício de direito, decorrente do direito de propriedade, como o locador – proprietário do bem.
Quanto aos vícios, a posse pode ser: justa ou injusta – violenta, clandestina e precária. A posse justa é aquela considerada limpa, ou seja, que não apresenta os vícios presentes na posse injusta.
Com base no Direito Civil Contemporâneo a classificação da posse quanto à boa-fé pode ser objetiva e subjetiva. A posse subjetiva pode ser de má-fé e de boa-fé. De acordo com Tartuce (2020) a classificação da posse com relação aos vícios subjetivos não se confunde com a relacionada aos vícios objetivos. Na análise dos vícios indicados no artigo 1.200 do Código Civil de 2002 são levados em consideração critérios objetivos. A boa-fé subjetiva considera a intenção dos envolvidos.
A posse no que se refere à presença do título pode ser com título e sem título. A posse com título é aquela em que existe uma causa representativa da transmissão da posse, por exemplo, contrato de locação e comodato. A posse sem título é aquela em que não existe uma causa representativa da transmissão da posse, por exemplo, quando alguém encontra um tesouro sem ter intenção de achá-lo (TARTUCE, 2020).
Interversão da Posse
Antes de tratar da interversão da posse, cabe apontar o caráter da posse. Nas palavras de Tepedino et al. (2020, p. 51) o caráter da posse é a modalidade pela qual a posse se apresenta – “legítima ou ilegítima, viciosa ou isenta de vícios, direta ou indireta, de boa-fé ou de má-fé, a título de propriedade ou autorizada pelo titular de domínio”.
Em regra geral, a posse mantém o caráter com que foi adquirida, salvo prova em contrário, nos termos do artigo 1.203, do Código Civil de 2002.
Dessa forma, a posse adquirida de maneira violenta, clandestina ou precária manterá tais características. Entretanto, o artigo 1.203 do Código Civil de 2002, ao reconhecer a prova em contrário, “permite a inversão do título da posse, pela qual se atribui novo fundamento jurídico à posse” (TEPEDINO et al., 2020, p. 51)
Salienta-se que a ninguém é conferido mudar, por exclusiva vontade, a causa ou o título da sua posse. Não basta a vontade do possuidor, pois é necessário confirmar a inversão do título, de acordo com circunstâncias concretas, que podem ser comprovadas e que afastam a presunção legal de manutenção do caráter originário da posse (TEPEDINO et al., 2020).
Conforme disposto no Enunciado nº 237 da III Jornada de Direito Civil sobre o artigo 1.203 é cabível “a modificação do título da posse – interversio possessionis – na hipótese em que o até então possuidor direto demonstrar ato exterior e inequívoco de oposição ao antigo possuidor indireto, tendo por efeito a caracterização do animus domini”.
Nesse sentido, tem-se a exposição da Juíza Daniela Paiva, que aponta que, para os juristas que defendem a possibilidade de interversão unilateral do caráter da posse existe a necessidade de manifestação externa e inequívoca do animus domini da pessoa que busca alterar o caráter de sua posse.
A Juíza Daniela Paiva entende que a posição indicada é a que atende melhor a função social da propriedade disposta no artigo 5º, Inciso XXIII, da Constituição Federal de 1988., que ocorre tendo em vista que a propriedade não pode mais ser considerada um direito absoluto, deve atender a sua função social e se tornar útil a coletividade. A Juíza aponta ainda, a necessidade de a interversão ser ato inequívoco e exteriorizado, para que não ocorra o cerceamento de defesa do direito de propriedade do proprietário.
Diante do exposto, percebe-se que a interversão da posse se trata de uma temática importante e que se relaciona com a função social da posse e da propriedade. Como indicado no primeiro tópico deste artigo, são frequentes os casos de conflitos entre direito de propriedade e posse. Vários operadores do direito já sinalizam a necessidade de conferir importância à função social da posse, em virtude do direito fundamental à moradia. Outrossim, a Constituição Federal de 1988 já garante a função social da propriedade.
Referências:
AZEVEDO, Álvaro Villaça. Curso de Direito Civil: direito das coisas. 2 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.
PAIVA, Daniela Reetz de. Interversão do Caráter da Posse. Série Aperfeiçoamento de Magistrados. Direitos Reais.
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: direito das coisas. v. 4. 12 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.
TEPEDINO, Gustavo. Fundamentos de Direito Civil. v. 5. Rio de Janeiro: Forense, 2020.
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